No Evangelho de hoje (Mt 23, 1-12) Cristo faz uma exortação direcionada aos cristãos convertidos. É muito comum hoje uma divisão na Igreja entre os tradicionalistas e os liberais, seara complicada cujo ponto ótimo sem dúvidas está em um meio termo.
A Igreja Católica historicamente evita "regrinhas". Impulsionada pelo uso da razão, a doutrina sempre permitiu uma interpretação à luz de princípios básicos de moralidade, além, é claro, dos seus divinos mandamentos.
No entanto, muitas vezes o que vemos são pessoas que buscam uma arbitrariedade: tal coisa é lícita ou não? Pode-se fazer aquilo ou não?
Veja, certos aspectos são inegociáveis e afastar-se deles significa apostatar ou tornar-se um herege. Por exemplo, não há argumentação a favor de aborto, métodos contraceptivos, etc. Por dedução lógica tais comportamentos ferem a doutrina da Igreja e precisam ser veementemente proibidos.
No entanto, para outros, há de se fazer o melhor julgamento, de acordo com a capacidade de cada um, e visando um aperfeiçoamento interior. Para certas coisas, cada um é senhor de si e o que for feito por amor a Deus será por Ele aceito.
Mas alguns católicos insistem num tradicionalismo barato, num conjunto de dos and don'ts que se transforma num verdadeiro fardo, um costume essencialmente farisaico que nada tem de cristão. Repito: o certo é o certo, mas saber discernir o essencial do acidental é também necessário.
Ademais, a Igreja insta-nos a odiar o pecado mas amar o pecador, portanto costuma ser bem fácil discernir aquele que está genuinamente interessado que um irmão cresça na fé daquele que, munido de ódio e soberba, apenas deseja apontar o dedo em tom acusatório.
Com a mesma medida que medirdes, vos medirão a vós, diz o Senhor (Lc 6, 38). Portanto, é sempre perigoso exigir dos outros aquilo que nós mesmos não conseguimos fazer, seja por iniquidade ou vaidade.
Cristo nos dá uma lição de humildade – há apenas um Mestre, todo o resto são aprendizes, por mais vistosas que sejam suas vestes e por mais ilustres que sejam seus vocativos. Assim, quando corrigimos um outro cristão, que isso seja feito de forma fraterna, com o cuidado de quem quer reencontrar-se no Céu, não com a austeridade de quem condena ao inferno.
Devemos, é evidente, olhar para a tradição da Igreja, aprender com os santos padres e os primeiros pais, mas sem perder de vista seu projeto pedagógico original – ide e ensinai, diz o Senhor; não ide e condenai. Confiemos na misericórdia de Deus e na graça que vem do Espírito Santo para que os irmãos que ainda manquitolam na fé possam soerguer-se, e que quando chegue a nossa hora do juízo recebamos em igual medida a compaixão que tivemos em vida.